A escuridão,sobretudo,era meu ponto mais fraco.
Nunca a temi,acreditando que ela era o motivo de meus
pesadelos sombrios,muito ao contrario,ficar no escuro era um deleite para minha
alma assustada e perdida em suas próprias dúvidas angustiantes.Ao escurecer
minha mente se acalmava,deixando que a claridade fosse a culpada das minhas
crises de abstinência.
A escuridão era a saída em casos urgentes quando se
tratava de ser posta em uma camisa de força.
Talvez todo mundo em casa estivesse mesmo pensando que eu
precisasse passar por um psicólogo e em
ultimo caso por um psiquiatra caro e bem competente,mas eu sabia que isso
passaria,por mais que demorasse a passar,mas,enquanto não passava,eu
permaneceria trancada em meu quarto com a luz apagada,o abajur desligado e as
janelas fechadas.
-Pâm...Saia daí ?
Detestava ignorar minha mãe desconsolada tentando me
consolar,mas isso só pioraria a situação.
-Ei mãe...-Disse baixo com todas as forças que consegui e
todo folego que me restava.-Ela se foi mãe,ela me deixou mãe...
E tentei estancar o choro derretido e amargo,fracassando
ao me lembrar de seu belo rosto e de sua mania de fazer cócegas em meus pés.
-Tem alguém aqui que quer te ver...
A voz de minha mãe estava acompanhada de tanto nervosismo
que todo o meu corpo tremeu.
-Não quero ver ninguém...
-Pâm,não seja assim...
Juntei meus pedaços e me levantei sem muita
vontade,evitando que minha consciência me cobrasse isso depois.Destranquei a
porta lentamente e,com seu rangido,ela se abriu.
Não acreditei na hora que olhei diretamente em seus olhos
e senti seu brilho invadir os meus.Olhos de quem tinha muito a me dizer,mas que
perdeu toda a reação a se deparar com meu estado amargurante.Olhos verdes e
cheios de vida.A vida que faltava em mim.
-Você...-Foi tudo o que consegui dizer.
Era ele.
Estava com um sorriso desajeitado nos lábios, me olhou de
cima a baixo temendo minhas olheiras inchadas com minha pele pálida e me deu um
abraço inesperado,tão confortante que meu lado forte sentiu vontade de ceder e
se render mais uma vez a suas doçuras gentis.
Não pensei em mais nada.
Chorei pesadamente em seus ombros,desejando que aquele
momento não fosse um sonho,ou que pelo menos eu não acordasse.Ele me pegou em
seu colo e se sentou em minha cama deixando que minhas lágrimas fossem as
únicas coisas a atrapalharem o silencio.Minha mãe acendeu a luz e me encarou
com um olhar puro de mãe preocupada.Ele fez que sim com a cabeça para ela e
ouvi seus passos saírem devagar encostando a porta do quarto.
Senti seus dedos tocando meu rosto e jogando meus cabelos
para trás.
-Seus cabelos continuam tão lindos...
Passou as mãos em meus cabelos suavemente desembaraçando
os fios e depois as desceu no contorno de minha boca.
-Você está tão...destruída.
Ele falou cada palavra com uma certeza perspicaz,me
causando um calafrio.
Engoli o nó da garganta e contive o soluço.
-É,estou...
Confirmei e me levantei de seu colo.
-Você não deveria estar aqui.
-É,talvez não deveria,mas estou...Talvez não deveria
muitas coisas,mas o que está feito Pâm...-Ele respirou e abaixou a cabeça.-Está
feito.E ninguém pode mudar.
Me sentei no chão e reclamei da claridade da lâmpada
suspendendo o escuro agradável.
-Sai do chão Pâm...
-Não.Está bom aqui.
Cruzei as pernas e prendi meus cabelos em um cóque com o
elástico que envelhecia em meu pulso direito.
-Quis dizer,levante-se.Levante-se dessa depressão.Sei que
não é fácil,ou talvez eu não saiba,mas pare Pâm...
Eu havia decifrado suas palavras,mas não queria
aceita-las.
Não havia mais alma sem ela.Não havia mais nada sem ela.E
somente eu entendia isso.
-Segredos meus...
Confessei a ele sem erguer minha cabeça.
-Eu sei.-Ele respondeu e ouvi suas feridas sangrarem por
saber que havia perdido muito da minha vida enquanto ela havia caminhado sem
sua supervisão.
-Não você não sabe.
-Ei Pâm,foi você que me mandou embora,mas estou aqui
agora.Sei o que te causei,acredite eu sei,sei e me arrependo,mas estou de mãos
atadas Pâm,de mãos atadas sem seu perdão.
Me levantei e o encarei secando as lágrimas na camiseta
velha e desgastada.
-Eu te perdoei.Perdoei.
Ele se levantou da minha cama e passou as mãos em minha
cintura me puchando para mais um abraço meramente obstinado.
-Me solte!
Tentei ficar irritada com sua teimosia mas nenhum de nós
nos renderíamos aquilo,porque ele sabia que aquelas palavras só demonstravam o
quanto eu ainda temia ama-lo,e o quanto,mesmo temendo,ainda o amava.
-Não vou te fazer mal.-Sussurrou em meu ouvido e soltou
meus cabelos tentando ajeita-los.-Eu sinto muito porque ela se foi e eu nem
pude estar do seu lado,mas essa dor vai passar,eu prometo.
- dizer não é nada
,pare de dizer!-Fechei meus olhos e dei permissão ao seu cheiro entrar
por minhas narinas.-Não vivo de palavras.
-Ninguém vive.-Ele concordou.-Mas no momento,as palavras
são o que eu posso oferecer para te confortar.
Minha mãe entrou no quarto abrindo as janelas e as
cortinas,sem se importar com minhas reclamações.O s raios do sol bateram fortes
em meus olhos,me causando uma repulsa da dor que logo despertaria novamente
dentro de mim.
-Vamos,acorde sua
preguiçosa!.Ouvi a voz da Miriam soar em meus ouvidos com o mesmo jeito de
abrir as cortinas e alegrar meu dia com seu sorriso.Minha cabeça ficou zonza e
eu me soltei nos braços dele tentando evitar as memórias,e,percebendo que isso
não surtiu em efeito algum,corri em direção a janela e fechei as cortinas com
lágrimas escassas,aquelas que só rolavam quando minha alma gritava com raiva da
morte.
(...)
Ideias?Sugestões?Aceito todas aqui nos comentários galera.
Até mais caros leitores.